No Dia Internacional de Mulheres e Meninas na Ciência, a Semana de Abertura PPGICS 2024 teve como tema principal a “Qualidade da informação, redes sociais e comunicação pública da ciência” debatido por pesquisadoras. Com moderação de Viviane Veiga (PPGICS), Thaiane Oliveira (UFF), Pâmela Araujo Pinto (PPGICS) e Ana Luiza Pavão (PPGICS) apresentaram suas pesquisas sobre as relações entre ciência, verdade e as crises que se impõem, perpetuam e extrapolam o universo de mídias e ferramentas digitais.
Pâmela Araujo, assessora de comunicação do Ministério da Saúde e professora do PPGICS, foi a primeira a falar. Autora do livro Boas práticas de saúde pública no Instagram: estudo comparado entre Portugal e Brasil, apresentou o trabalho que originou a publicação, feito entre 2019 e 2022, e as mudanças que se impuseram nas comunicações oficiais de órgãos estatais em função da pandemia de covid-19.
A pesquisa foi feita por Pamela no estágio de pós-doutorado no Centro de Investigação em Mídias Digitais e Interação (DigiMedia), do Departamento de Comunicação e Arte da Universidade de Aveiro, Portugal, e acompanhou as estratégias dos governos do Brasil e de Portugal para falar de saúde na rede social digital. O estudo analisou as estratégias dos governos do Brasil e de Portugal para falar de saúde no Instagram para abordar criticamente o consumo de saúde na rede social digital com base no mapeamento de mudanças e adaptações dos perfis @minsaude e @sns_pt antes e durante a pandemia de covid-19.
A proposta era observar a abordagem, a imagem, o texto e a interação e orientar autoridades sanitárias, profissionais de comunicação, de saúde e comunicadores populares sobre como valorizar o cidadão e a cidadã como o centro da comunicação produzida sobre saúde, ancorada no interesse público e na busca por ampliar a participação social aproveitando a potencialidade da rede no diálogo com a população.
Thaiane Oliveira, professora do Programa de Pós-graduação em Comunicação da Universidade federal Fluminense (UFF), coordenadora do Laboratório de Investigação em Ciência, Inovação, Tecnologia e Educação e fundadora da rede Latmetrics, consolidada em 2018, que reúne mais de 200 pesquisadores da América Latina para discutir e desenvolver métricas e indicadores alternativos para avaliação da ciência, falou em seguida. Apresentou a pesquisa intitulada “Entre os mercadores da dúvida e as salvaguardas da verdade: disputa sobre a informação nas agendas sobre a desinformação científica”.
Para ela, a dúvida, premissa de toda pesquisa e de toda realização científica, tem sido instrumentalizada por interesses econômicos e políticos. Não faz mais parte do terreno da desconfiança, mas de contestação: “É uma guerra e não um pressuposto de questionamentos próprios do fazer ciência. Por isso, é tão importante discutirmos sobre os desafios e as oportunidades para a comunicação diante do contexto da agenda sobre desinformação científica”.
Thaiane apontou para caminhos e chaves que possibilitam compreender a base do que deve ser analisado. Primeiro, precisamos observar a intencionalidade da propagação da desinformação: “Ao chamarmos de guerra contra a desinformação, estamos naturalizando uma situação em que se pressupõe a suspensão da racionalidade e da democracia”.
Depois, a legitimação epistêmica, no qual a autoridade é legitimada ou se impõe como a única detentora do saber: “Por exemplo, quando o jornalista diz para um outro ‘não jornalista’ que ele não pode informar. Aí, eu pergunto: e os comunicadores comunitários?”, completa Thaiane.
Em seguida, a crise de credibilidade, que não significa falta de interesse: “Pesquisa recente mostrou que o interesse da população brasileira pela ciência é maior do que a média mundial (70% aqui; 46% no mundo). Então, não há negação a priori da ciência, mas uma desconfiança”.
Para Thaiane, por isso, é fundamental analisarmos os contextos nos quais as informações ou as desinformações circulam: “Há o contexto psicossocial – que envolve o sentimento de pertencimento, o sistema de crenças, familiares, amigos, influenciadores digitais, emoções etc. – e o tecnológico, principalmente das mídias digitais”. Isso é importante porque a informação científica, por exemplo, é um campo de disputa, que mobiliza atores, emoções, discursos e aqueles que se impõem como salvaguardas da verdade: “Hoje, a bancada do like é mais forte que a da ciência”.
Ana Luiza Pavão, a última a falar, destacou a importância do que foi dito até então por suas companheiras de debate até para corroborar sua pesquisa: “Falar sobre a importância do letramento e da literacia digital para a saúde é extremamente necessário”. Ana Luiza é coordenadora técnica da publicação Autocuidado em saúde e literacia para a saúde, editada pelo Ministério da Saúde, que tem como objetivo ser um guia para profissionais da saúde em contexto da promoção, prevenção e cuidado das pessoas em condições crônicas.
Ana Luiza apontou para a necessidade de compreendermos que saúde não é só a ausência de doença, mas um conjunto de fatores que também envolve o acesso à informação e a superação da dificuldade de avaliar a relevância e a confiabilidade de fontes diversas: “No processo que hoje vivenciamos, da medicina baseada em evidências até a medicina baseada em experiência, é preciso entender que comunicação não é publicidade final, mas a construção de conhecimentos que devem ser avaliados e aplicados. Além do público, todos aqueles que trabalham com saúde precisam entender as novas dinâmicas, os novos problemas e as novas possibilidades”.