Deu zika no Fantástico: risco, vítima virtual e modos de endereçamento durante as emergências da epidemia no show da vida

Este trabalho busca compreender como o Fantástico, programa telejornalístico da Rede Globo, apresentou os riscos de zika e microcefalia para a sua audiência, desde a descoberta da doença no Nordeste, passando por uma epidemia nacional até a emergência internacional. A análise foi orientada pelos conceitos de risco e vítima virtual (VAZ,2009), utilizando os principais operadores de modos de endereçamento, propostos por Gomes (2011). As matérias veiculadas em quatro anos, entre abril de 2015 e abril de 2018, respondem pelo nosso corpus ampliado e as reportagens exibidas durante as emergências, de 11 de novembro de 2015 a 11 de maio de 2017, formam o corpus reduzido. Observamos, em primeiro lugar, o pouco espaço dedicado ao tema. Entre os resultados, de abril de 2015 a julho de 2018 foram veiculadas 20 matérias, totalizando 1 hora e 55 minutos. Em seguida, o destaque dado aos cientistas, às mulheres grávidas e ao mosquito Aedes aegypti. Esses foram os grandes protagonistas das reportagens sobre zika, mas desempenhando papéis diferentes. Os primeiros, fontes de autoridade e esperança; o último, apresentado como inimigo a ser combatido. Entre eles, e no centro da emergência, estavam as mulheres, principalmente as grávidas e as com planos de gravidez. No entanto, apesar de sua abrangência nacional, Fantástico privilegiou uma camada específica da população feminina brasileira: a classe médi1a, branca, moradora do Sudeste do país. Essa característica fala tanto do público imaginado pelo Fantástico, como da figura da vítima virtual. A cobertura de uma doença que teve início no Nordeste, afetando principalmente mulheres pobres e moradoras de áreas sem infraestrutura e saneamento básico adequados, foi protagonizada no \201Cshow da vida\201D quase que inteiramente por um grupo que não representa as mulheres mais vulneráveis a esta e outras arboviroses. Nessa guerra contra o Aedes, a responsabilização individual aparece em primeiro plano, em detrimento ao papel do Estado na garantia dos direitos e políticas públicas relacionadas ao zika vírus. Concluímos que a mulher, principalmente as mais vulneráveis, como é comum na sociedade brasileira, esteve na linha de frente da epidemia, sem contar com apoio e políticas públicas, tanto para efetivar medidas de proteção contra a infecção quanto para cuidar de bebês que nasceram com microcefalia, e que a forma como as matérias foram produzidas não questiona, ao contrário, legitima essa condição.

Orientador
Janine Miranda Cardoso
Autor
Paula Fiorito de Campos Ferreira
Citação

FERREIRA, Paula Fiorito de Campos. Deu zika no Fantástico: risco, vítima virtual e modos de endereçamento durante as emergências da epidemia no show da vida. 2019. 140f. Dissertação (Mestrado em em Informação e Comunicação em Saúde) - Programa de Pós-graduação em Informação e Comunicação em Saúde, Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde, Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, 2019.

Ano
2019
Palavras-chave
Comunicação em saúde
Zika Vírus
Risco
Jornalismo
Banca (Integrantes PPGICS)
Line 2: Igor Pinto Sacramento
Banca (Integrantes Externos)
Michele Nacif Antunes (Fiocruz)
Tipo de documento
Dissertação