Professores do PPGICS contemplados com bolsas da Faperj

No dia 1º de dezembro, a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj) divulgou o resultado dos editais Programa Cientista do Nosso Estado (CNE) e Programa Jovem Cientista do Nosso Estado (JNCE). Ao todo, foram 28 contemplados da Fiocruz – 18 no CNE e 10 no JNCE. Dentre eles, estão Igor Sacramento e Marcel Pedroso, professores e pesquisadores do PPGICS.

Como ressalta Igor Sacramento, os programas se confundem com a história da Faperj no apoio a pesquisas realizadas por instituições do estado do Rio de Janeiro: “No caso do Jovem Cientista do Nosso Estado, são apoiados projetos coordenados por pesquisadores com defesa de doutorado a partir de agosto de 2011. Apoiam-se, portanto, lideranças emergentes por um período de 3 anos, com bolsas mensais. É uma iniciativa muito importante para o desenvolvido da pesquisa científica no estado”.

Um dos destaques do edital é a obrigatoriedade dos pesquisadores desenvolverem atividades científicas e/ou tecnológicas – palestra, curso, exposição, visita a laboratórios, elaboração de vídeo conteúdo etc. – para alunos de escolas públicas e/ou professores do ensino básico de escolas sediadas no Estado do Rio de Janeiro. Marcel Pedroso destaca que esse é um dos itens que se inter-relacionam com o trabalho da Fiocruz, que envolve jovens de instituições fluminenses em programas, projetos e capacitações: “Apesar da Fiocruz ser uma instituição federal de pesquisa e ensino, temos um engajamento comunitário e parcerias locais muito consistentes”. Igor Sacramento concorda e ressalta que isso também possibilita refletir sobre outras e novas formas necessárias de compartilhar conhecimentos, uma vez que a experiência da pandemia de covid-19 escancarou a impossibilidade de manter as pesquisas científicas dentro apenas da academia: “precisamos buscar formas de comunicação da ciência com a sociedade. Isso não é apenas divulgar os resultados das pesquisas realizadas ou agendar uma pauta na imprensa. É muito mais. É nosso dever ético-político como pesquisadores financiados por verbas públicas buscar formas de contrapartida social”.

Os dois professores do PPGICS representam a diversidade da área interdisciplinar em que o Programa se inscreve, desenvolvendo pesquisas que investigam e analisam criticamente o circuito social do conhecimento. Igor Sacramento, também atual coordenador do PPGICS, está no grupo de professores que pesquisam comunicação, poder e processos sociais em saúde, tendo como premissa básica de que o direito à comunicação é indissociável do direito à saúde . Ele foi contemplado no edital da Faperj com o projeto A experiência como evidência: a internet e os testemunhos antivacinação no Brasil contemporâneo (1999-2022).

Marcel Pedroso está associado à linha que se dedica a analisar a política, a produção, a organização e o uso da informação para análise, vigilância, monitoramento e avaliação de sistemas de saúde, da situação de saúde da população brasileira e de seus determinantes sociais e ambientais. Foi  contemplado com o projeto Aprendizagem de Máquina para estimar anos de vida perdidos ajustados por incapacidade ou morte.

Abaixo, você conhece um pouco mais sobre os projetos contemplados, as ideias e o trabalho que Igor Sacramento e Marcel Pedroso desenvolvem na Fiocruz e em pesquisas no campo da Informação e Comunicação em Saúde:

Vocês foram contemplados com a bolsa do Programa Jovem Cientista do Nosso Estado da Faperj 2022 com os projetos “A experiência como evidência: a internet e os testemunhos antivacinação no Brasil contemporâneo (1999-2022)” e “Aprendizagem de Máquina para estimar anos de vida perdidos ajustados por incapacidade ou morte". Como surgiu a ideia e a necessidade dessas pesquisas?

Igor Sacramento: Em primeiro lugar, gostaria de ressaltar a importância do Programa Jovem Cientista do Nosso Estado, que com o Cientista do Nosso Estado, se confunde com a história da Faperj no apoio a pesquisas realizadas por instituições sediadas no estado do Rio de Janeiro. No caso do Jovem Cientista do Nosso Estado, são apoiados projetos coordenados por pesquisadores com defesa de doutorado a partir de agosto de 2011. Apoiam-se, portanto, lideranças emergentes por um período de 3 anos, com bolsas mensais. É uma iniciativa muito importante para o desenvolvido da pesquisa científica local.

Meu projeto está relacionado há anos de pesquisa no campo da comunicação e saúde. Pesquiso, de maneira mais longeva, discursos midiáticos e, em particular, narrativas biográficas sobre corpo, saúde e doenças. Já coordenei, com apoio do CNPq e da Faperj em diferentes editais, projetos sobre a cultura do corpo e a emergência do discurso fitness sobre influenciadores digais de saúde (especialmente, musas fitness), os testemunhos de celebridades sobre doenças e transtornos psicológicos e, mais recentemente, os canais do YouTube centrados na exposição diária de viver com alguma doença ou condição de saúde. Paralelamente, desde a pandemia de Influenza H1N1, entre 2009 e 2010, venho me dedicando ao estudo das concorrências discursivas em torno da vacina e da vacinação. Também coordenei, em parceria com a professora Raquel Paiva, do Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Cultura da Universidade Federal do Rio de Janeiro (PPGCOM/UFRJ), um projeto sobre a adesão à vacina de febre amarela entre 2017 e 2019 diante de um novo surto.

No contexto da covid-19, no âmbito do Núcleo de Estudos em Comunicação, História e Saúde (Nechs), que coordeno com o colega de Icict e PPGICS, Wilson Couto Borges, iniciamos um amplo processo de reflexão sobre desinformação científica em saúde. Muitos dos meus orientandos, integrantes do Nechs, contribuíram na colaboração de artigos que foram importantes para compreender as conexões da desinformação sobre a covid-19 e o contexto de política de pós-verdade, no qual se destaca a ascensão da extrema direita e de um processo amplificado de desdemocratização do Brasil, o que atingiu gravemente o SUS e, em particular, o Programa Nacional de Imunizações. Como venho, há alguns anos, trabalhando as relações entre comunicação, história e saúde e, há mais de duas décadas, estudando a historicidade de processos comunicacionais, foi uma escolha importante nesta pesquisa unir os dois universos de pesquisa que estão me mobilizando bastante: testemunho e desinformação. Numa perspectiva histórica, trabalharei com testemunhos circulantes na internet em momentos de crise para a vacinação no Brasil: a campanha de vacinação de Influenza para idosos entre 1999/2000, o surto de febre amarela silvestre em 2008, o da pandemia de Influenza H1N1 em 2009/2010, a campanha de vacinação contra o HPV para meninas de 9 a 13 anos em 2014/2015, a re-emergência da febre amarela silvestre entre 2016 e 2018 e a pandemia de covid-19, considerando, especialmente, o período entre 2020 e 2022.

A escolha do tema deste projeto, assim, se dá de maneira dupla. Primeiramente, busco compreender qual era o lugar do testemunho no processo discursivo de construção do verdadeiro e suas formas de legitimação social em diferentes momentos da história recente do país. Quero identificar aqui o lugar do testemunho e da experiência pessoal, de modo mais amplo, como evidência da realidade e como força retórica de garantia de que aquele fato/acontecimento realmente tendo existido ou sido daquela forma. Também me interessa observar como a circulação discursiva sobre vacinação e narrativas antivacinação foram sendo, ao longo do tempo, classificadas e colocadas em relação de causalidade pela impressa e especialistas em saúde pública com a hesitação ou a recusa vacinal. A perspectiva histórica permite desnaturalizar o presente e o passado. Tenho visto, com preocupação, muitos trabalhos associando fake news a fenômenos comunicacionais vinculados a estruturas sociais que não poderiam ser classificados como tal. Dessa forma, é também para evitar anacronismos que realizo esta pesquisa. E quando não eram fake news? E quando os boatos eram os principais acusados com relação à recusa vacinal? Quais são as especificidades discursivas e históricas de fake news e boatos? É atrás disso que esta pesquisa está.

Marcel Pedroso: Gostaria, em primeiro lugar, de reconhecer que a conquista da bolsa do Programa Jovem Cientista do Nosso Estado só foi possível pelo amadurecimento e dedicação de todos os integrantes da Plataforma de Ciência de Dados aplicada à Saúde (PCDaS/LIS/ICICT) que, atualmente, coordeno.

Um dos principais problemas metodológicos que precisamos lidar cotidianamente em nosso Laboratório é a construção e o cálculo de indicadores de saúde e seus determinantes socioambientais para pequenas áreas, visando, dessa forma, subsidiar políticas públicas de saúde mais precisas e efetivas.

Integramos bases de dados de diversas fontes que têm unidades espaciais diferentes (estado, município, região de saúde, região administrativa, setor censitário etc.). Convergir essas informações para uma unidade espacial relativamente pequena e, depois, ser capaz de agregá-las e reconstruir áreas maiores com robustez metodológica é o grande desafio da pesquisa.

Como premissa básica para o desenvolvimento do projeto, está a realização de uma atividade científica e/ou tecnológica para alunos de escola pública do estado do Rio de Janeiro. A proposta de pesquisar, compartilhar conhecimento e envolver crianças e jovens no processo fez parte da motivação para participar deste edital?

Igor Sacramento: A experiência da pandemia de covid-19 escancarou uma impossibilidade: a manutenção das pesquisas científicas encasteladas. Precisamos buscar formas de comunicação da ciência com a sociedade. Isso não é apenas divulgar os resultados das pesquisas realizadas ou agendar uma pauta na imprensa, é muito mais. É nosso dever ético-político como pesquisadores financiados por verbas públicas buscarmos formas de contrapartida social.

O envolvimento do público com a ciência descreve interações intencionais e significativas que oferecem oportunidades de aprendizado mútuo entre cientistas e membros da sociedade. A aprendizagem mútua refere-se não apenas à produção, à circulação e ao consumo de conhecimento, mas também ao aumento da familiaridade com uma variedade de perspectivas, enquadramentos e visões de mundo. As metas para o envolvimento do público com a ciência, além do aprendizado mútuo, incluem habilidades de engajamento cívico e empoderamento, maior conscientização da relevância cultural da ciência e reconhecimento da importância de múltiplas perspectivas e domínios de conhecimento para empreendimentos científicos. Como a ciência prevalece em todas as facetas de nossas vidas, a relação ciência-sociedade é complexa e há muitas maneiras de abordá-la. O relacionamento pode ser construtivo, cheio de tensão etc. A interação entre as partes interessadas é fundamental para encontrar um terreno comum em questões científicas que afetam a sociedade. O envolvimento do público pode fornecer uma plataforma construtiva para que as opiniões do público sejam combinadas com conhecimentos científicos em contextos de tomada de decisão. A abordagem de engajamento público, geralmente, usa e se baseia nos esforços de compreensão do público, ao mesmo tempo em que se move em direção a oportunidades mais abrangentes e interativas de diálogo e troca. Por meio do engajamento, os cientistas e o público participam de discussões sobre os benefícios e os riscos da ciência e da tecnologia impactando nossas vidas diárias. Ao fazer isso, perguntas e preocupações podem ser mais bem compreendidas e abordadas.

Além disso, envolver uma ampla gama de partes interessadas pode conectar pontos de vista aparentemente não relacionados, com efeitos potencialmente de longo alcance. Os cientistas podem expandir o alcance de seu trabalho e torná-lo mais relevante para a sociedade. Sendo assim, entendo que ações como esta da Faperj nos ajudarão na formação de novos cientistas e na ampliação da compressão da importância da ciência no desenvolvimento social e humano.

Marcel Pedroso: Sim, apesar da Fiocruz ser uma instituição federal de pesquisa e ensino, temos engajamento comunitário e parcerias locais muito consistentes. No caso da PCDaS, por exemplo, temos em nossa equipe três alunos de graduação em ciência da computação e uma aluna de doutorado do Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca (Cefet/RJ), um de graduação em ciências matemáticas da UFRJ e quatro pós-graduandos do Laboratório Nacional de Computação Científica (LNCC), em Petrópolis.

Fora a participação desses jovens de instituições fluminenses em nossa Plataforma, temos uma iniciativa denominada “Projeto Acadêmico”, que oferta a infraestrutura de computação científica da PCDaS e um tutor de nossa equipe para acompanhar o desenvolvimento de TCCs, dissertações de mestrado e teses de doutorado que pretendam utilizar ferramentas de ciência de dados.

Além disso, temos também atuação com jovens pesquisadores que ajudam a estreitar ainda mais a relação entre o PPGICS, o Instituto de Informação e Comunicação Científica e Tecnológica em Saúde (Icict), a Fiocruz e o Estado do Rio.

Atualmente, ofertamos semestralmente a capacitação “Ciência de Dados aplicada à Saúde” nas modalidades disciplina eletiva regular (PPGICS) e curso de atualização pelo Icict. Temos centenas de egressos capacitados em ciência de dados e pretendemos fomentar essa rede para aplicações práticas desse conhecimento no SUS.

Como docente permanente do PPGICS, sempre incentivo meus orientandos(as) a estudar a linguagem de programação Python e direcionar seus estudos para o campo da Ciência de Dados que é muito diverso, desafiador e tecnologicamente frenético

Como se dará o desenvolvimento do projeto, o que ele envolve? 

Igor Sacramento: Embora este seja um projeto de natureza individual, é preciso reconhecer que todo projeto de pesquisa é na prática coletiva. Envolve também parceiros de pesquisa e orientandos. Cria-se uma agenda de pesquisa. As próximas orientações, certamente, estarão mais ancoradas neste projeto e no seu universo temático. No meu caso, em particular, a interação com o PPGICS é enorme. Destaco os professores Wilson Borges e Izamara Machado, que também integram o Nechs e com quem tenho inúmeras afinidades de pesquisa. Compartilhamos e amadurecemos nossas pesquisas em conjunto. Dos meus orientandos atuais, nos dois programas de pós-graduação que  participo como docente, destaco a contribuição de Ana Carolina Monari (PPGICS/Fiocruz), Allan dos Santos (PPGCOM/UFRJ), Roberto Abib (PPGCOM/UFRJ) e Xuewu Chen (PPGCOM/UFRJ). Também destaco o papel relevante das duas pesquisadoras de pós-doutorado sob a minha supervisão: Hully Falcão (PPGICS/Fiocruz) e Flavia Leiroz (PPGCOM/UFRJ). O projeto também tem conexões com o que está sendo coordenado pelo professor Paulo Vaz (PPGCOM/UFRJ), com financiamento da Capes no Edital de Seleção Emergencial Impactos da Pandemia, e do qual participo como um dos integrantes. Também integro, com a professora Kizi Araujo, uma pesquisa financiada pela Faperj e coordenada pela professora Thaiane Oliveira (PPGCOM/UFF), em que os impactos da desinformação científica no SUS estão sendo considerados. Menciono por fim a não menos importante parceria com a professora Luisa Massarani, querida colega da COC/Fiocruz, na divulgação científica em saúde no contexto de intensa desinformação. Então, acredito que o projeto já demonstra fortes indícios de articulação em rede. Sua realização, sem dúvidas, está articulada a essa experiência compartilha e solidária de pesquisa que venho procurando manter com diferentes colegas e instituições no Rio de Janeiro.

Marcel Pedroso: O Brasil tem vivenciado um processo de mudança do perfil de adoecimento e morte da população, com queda acentuada da mortalidade por doenças transmissíveis, da mortalidade de menores de cinco anos e redução significativa das causas evitáveis de morte, o que impactou positivamente o aumento da expectativa de vida. Também vem ocorrendo um nítido aumento das doenças crônicas não transmissíveis, como diabetes, doenças cardiovasculares, neoplasias malignas, entre outras, e das mortes por violência, como os acidentes de trânsito.

Esse novo perfil de saúde-doença necessita de uma renovada atenção à saúde e às políticas nacionais de saúde que busquem inovar no campo da ciência da informação por meio da pesquisa e do desenvolvimento de novas métricas e escalas de análise para mensurar a situação de saúde da população.

Iniciativas como a Global Burden of Disease (GBD) estão, por meio de métodos criativos e intensivos em computação científica, buscando estimar dados e indicadores de saúde-doença através de bases de dados públicos individualizados, porém, não identificados. Disponibilizam regularmente os resultados de seus estudos, publicizam as metodologias e as fontes de dados utilizados para a construção de suas principais métricas years of life lost (YLLs), years lived with disability (YLDs), e a combinação dos dois últimos disability-adjusted life-years (DALYs), bem como suas tendências desde 1990 e ferramentas para visualizações interativas desses resultados, permitindo, dessa forma, que pesquisadores construam comparações entre as populações.

Nesse contexto, o projeto visa contribuir com avanços metodológicos para o cálculo de estimativas sobre YLLs, YLDs e DALYs em unidades de análise mais desagregadas (estimativas locais) do que as atuais, como o país ou estados da federação. Essas estimativas locais serão otimizadas com a comparação do desempenho preditivo de algoritmos de machine learning apoiados pelo método Hexagonal Hierarchical Geospatial Indexing System (H3).

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Data de publicação
1 year 11 months atrás